A Vila (chamada hoje de Centro, ou só “Mangaratiba”) perdeu muita gente e muitos prédios históricos na epidemia de varíola do século XIX. Cary explica que, temendo contaminação, as autoridades mandaram derrubar as casas dos doentes, e quem chegou depois construiu como pôde.
Até os anos 50 as ruas eram de terra. Genny, Georgette e Julieta iam buscar água potável na “Toca da Velha”, cozinhavam e esquentavam a água do banho no fogão a lenha, e usavam lampiões a querosene. Então as ruas foram calçadas com pedras.
Nos anos 60, o asfalto e a eletricidade chegaram. Emilzinho conta que, até os anos 80, os córregos eram abertos e interligavam os quintais das casas. Na quadra que Sirlene frequentava Bauer jogava futebol, e Silvio jogava vôlei na praia do Centro quase todos os dias. Miguelzinho gostava do Cinema Januzzi e Deo do burburinho na praça nos finais de semana perto dos horários do trem.
João Luiz brincava na Praia do Saco, que era um areal e, ao lado do cemitério, tinha um charco, onde Vicente e os outros garotos colhiam lírios para as missas.
Hoje, a praia do Centro – onde Luciano assistia grupos de botos evoluírem e Silvio pescava em abundância de tarrafa e jererê – não é mais própria para banho e os moradores dali só vão à praia na Ribeira.
Cida lembra com carinho do imenso flamboyant na praça do Junqueira, que continua resistindo à destruição. Cary e Mirian sentem saudade da Praia de Ibicuí, que era a mais linda da cidade, antes de ser tomada pelas construções. Ernestina e Manoel estão esperançosos que, depois de uma vida de escravidão, a vida melhore no Quilombo Santa Justina-Santa Izabel.
Quando São João Marcos foi inundada para a ampliação da represa, em 1940, boa parte de seus moradores, como a família de Luciana e Maria das Graças, migraram para a Serra do Piloto, uma pequena comunidade rural unida ao redor da capela. Era acessível a pé pela Estrada do Atalho, atrás da casa dos avós de Lucimary, ou de transporte pela Imperial que, como Gugu lembra, era calçada com pedras pé-de-moleque. Nos anos 80, Maria das Graças brincava na praça e ouvia histórias de terror à luz da única lâmpada da comunidade quando escurecia.
Assim também era Conceição de Jacareí, uma antiga aldeia. Maria José não contava mais do que 30 casas simples na sua infância nos anos 40. Sem luz nem serviços públicos, quem resolvia todas as burocracias era Seu Dito Filhinho e, até os anos 70, Fernanda contava nos dedos quantos comércios havia; a luz só chegou nos anos 90. Ela e a prima Angela, quando crianças, brincavam até escurecer nas cachoeiras e praias e depois corriam para casa fugindo do breu e de assombração.
Itacuruçá e Muriqui eram grandes fazendas, então seus trabalhadores foram os primeiros moradores. Recebiam moradores das ilhas, ainda muito rústicas, que vinham comprar mantimentos e serviços, e vender pescado, como a família de Vânia.
Daila, Gil e Kakau passaram a infância correndo pelas ruas de terra, mergulhando nas cachoeiras e na praia em Itacuruçá – e Ricardo diz que, quando anoitecia, a garotada se encontrava sob a luz fraca dos poucos postes da usina local pra bater papo até a hora de dormir.