GIL DEL CARMO

MANGARATIBA - CENTRO

Para eu falar da minha relação com Mangaratiba eu tenho que voltar duas gerações da minha família. Tudo começou com a questão dos meus avós: Sebastião Rodrigues de Miranda e a Maria Laurindo de Miranda. Ambos moravam na Ilha da Gamboa. Jovens, em 1944 meu avô foi para a guerra. Ele tinha prometido a minha avó que voltaria para casar-se com ela e minha avó, aquela caiçara linda, esperou meu avô. Eu lembro que ela contava as histórias que o pessoal passava, e ela era muito bonita, com traços praieiros, e falava assim: “ele vai voltar só um toco, vai voltar sem braço, vai voltar sem perna”. Aí ela falava assim: “ele pode voltar do jeito que quiser, mas eu vou estar esperando”. E aí ela ficava na janela. Então eu até fiz uma poesia em homenagem à memória dos dois que está no Beco da Poesia e chama-se ‘Da Gamboa pela janela’. Então eles se casaram numa ciranda. Não temos fotos porque a família era muito pobre na época e não tinha essa questão de tirar fotos. Mas ela contava que casou numa festividade, estabeleceu moradia no distrito de Itacuruçá, onde já tinha um pouco da nossa família também e as irmãs dela. Meu avô depois que veio da guerra se estabeleceu como trabalhador da linha férrea e ficou no trajeto Mangaratiba-Itaguaí e trabalhando como fiscal de linha, algo assim. Com isso tudo ele acabou ganhando um dinheiro e passou a residir lá em Coroa Grande. E aí teve os filhos todos e trabalhava muito, era comerciante, e a família cresceu e se estabeleceu em Itaguaí. Parte da nossa outra família se estabeleceu aqui em Itacuruçá, a família da irmã da minha avó. Minha ligação com o Mangaratiba começa minhas vindas de férias em Itacuruçá. Todas as férias escolares eu vinha, ficava com meus primos, a gente pescava, ia na praia, participava das festividades da Festa de Santana. Enfim, era o ponto alto da minha vida por uns bons 10 anos. Eu sempre tive o sonho de morar em Mangaratiba, principalmente em Itacuruçá. Com o passar do tempo, eu comecei a minha vida lá em Itaguaí como produtor cultural e curador do Centro Cultural de Itacuruçá (CEFEC) e trazia exposições da Universidade Rural do curso de Belas Artes que eu estava fazendo, para a Costa Verde, sempre expondo lá obras dos meus associados da minha empresa Zoio da Arte. Em 2018, recebi o convite para trabalhar como curador do Museu Municipal. Com isso, cheguei aqui no município, fui estreitando os laços, me mudei com a minha família para cá em 2019 em novembro de 2019. A gestão foi mudando e hoje eu trabalho como Diretor de Cultura lá da Fundação e presto consultoria de editais e de projetos para comunidades tradicionais. Tenho uma grande inserção nas comunidades quilombolas, nas comunidades caiçaras aqui do município. É um trabalho que eu gosto muito e amo muito fazer porque são comunidades que não eram assistidas com esse tipo de trabalho, não participavam de projetos e hoje estão concorrendo, ganhando os editais e melhorando as condições de trabalho nas suas localidades. É um trabalho que eu gosto muito. Eu fiz o contrário: meus avós saíram de Mangaratiba e eu retornei. É uma cidade que eu amo demais, amo a história, amo as pessoas porque são altamente hospitaleiras, com um coração imenso e que me receberam de forma muito calorosa. É um sonho que eu acabei realizando, de estar morando nesse local. Não em Itacuruçá, mas só de estar no município eu já fico feliz da vida e sou muito feliz por isso. Às vezes paro para pensar sobre isso. Quando a gente fala sobre o futuro a gente quer progresso, né? Eu quero progresso para minha cidade, mas que nunca esse progresso venha sem perder o que Mangaratiba tem de melhor, que é essa identidade, esse povo maravilhoso. Penso num futuro onde o artista não precisa mendigar seu trabalho para a prefeitura, um futuro em que eu possa sair com a minha família com roteiros culturais e turísticos, um futuro que possa ser melhor para as pessoas, possa ter políticas públicas mais acolhedoras, que se torne referência na questão de cultura, turismo e ação social que são as três áreas que eu mais me identifico. Uma política pública que possa manter as pessoas aqui e que elas não precisem se humilhar para poder seguir as suas vidas e que tudo isso seja feito sem agredir o meio ambiente, que é o mais difícil. É isso.

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