MARIA JOSÉ ETELVINO

Conceição de Jacareí

Nasci em Conceição de Jacareí em 11 de novembro de 1937. Minha mãe era da terra, assim como a minha avó Maria Eulália, que era escura, e a minha bisavó e os antepassados. O pai de minha mãe era branco, português, chamado Manoel Antônio Teodoro. Minha mãe com 18 anos conheceu meu pai. Tiveram 9 filhos: eu, José Ailton, Tereza, Didita, Magali, e mais quatro que faleceram. Meu pai trabalhava como varredor de quintal e a mãe lavava roupa pra fora, nas casas de fazenda. Não tive infância. Pobre tem infância? Lembro que não tínhamos o que comer, então meu pai pegava um cacho de banana, amarrava nas costas e ia vender para o Edu Julião para poder comprar um peixe e a família comer. A gente comia peixe com banana, comida tipicamente caiçara. Só fui ter sobrenome quando me aposentei. Meu pai, quando me batizou, já devia ter tomado umas cachaças e me registrou apenas como Maria José. Foi o prefeito Aarão que me ajudou, fazendo uma nova certidão, aos 80 anos. Em 1958, tudo em volta era mato. Não tinham os barracos que se vê hoje. Eu descia o morro todo sem encontrar ninguém. Ia para o baile, todo mundo dançava, mas não tinha luz: era lampião, tocha de bambu com querosene ou só a lua. Ninguém tropeçava ou caía, de tanto que conheciam os caminhos. A gente era índio e não sabia. O Sr. Benedito Moreira, avô do Perninha, morava acima da nossa casa e ele que fazia o carnaval. Doava tecidos pra gente fazer as fantasias de cigana. Tinha um senhor que fazia a fantasia de burrinha. Eu tinha entre 10 e 12 anos. O bloco inicialmente desfilava em Conceição, só anos mais tarde os Fenianos passaram a ir para Mangaratiba desfilar contra os blocos de lá, no meio dos anos 80. A vida inteira fui baiana, mas não sambo mais. Antes da Rio-Santos, eu trabalhava como doméstica no Rio, mas estava sempre em Conceição para poder cuidar da minha mãe. Dou graças a Deus pela construção da rodovia e não ter que pegar mais aquela lancha horrorosa. Perdi a mala no mar ao desembarcar com a minha filha pequena. Uma vez, na época da construção da Rio-Santos, cheguei do Rio de trem trazendo a medicação para o meu pai, que estava com câncer, mas quando cheguei, a lancha já tinha partido. Consegui uma carona. A Rio-Santos toda em obras, com muitas pedras e lama, só cheguei em Conceição mais de dez da noite. Consegui uma vela na casa da Dona Dulce e, chorando, subi com a ajuda de um vizinho, só com uma vela, no escuro, a trilha até a casa do meu pai. Por isso, a data da construção da estrada não sai da minha cabeça: 1975 foi o ano em que meu pai morreu. A obra foi enorme, com muitos peões. Muitas moças dali se casaram com peões. No meu tempo, ninguém ia à praia porque a minha mãe não deixava. A praia era só para os homens. Só fui à praia depois de burra velha, que voltei a morar em Conceição. Aí ninguém me manda, né?

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